Bia Nóbrega (Host):
“O desabafo corporativo de hoje é: ‘Um dia ruim na vida pessoal não pode ser um dia ruim no trabalho’. Será mesmo? Me conta, Beto, qual é o seu ponto de vista? Vamos desabafar?”
Beto Gioia:
“Vamos desabafar sobre isso, Bia! Esse é um ótimo desabafo, afinal, somos um ser só, certo? Não dá para separar vida pessoal e profissional como se fossem duas coisas distintas. Finalmente, essa ideia está começando a ser mais aceita, mas, mesmo assim, na prática, a realidade é diferente. Muita gente até entende o conceito, mas, no dia a dia, ainda cobra essa separação. Como, por exemplo, quando um chefe diz: ‘Seu filho estava doente? Ok, mas você tem que ser profissional e focar no trabalho’. O discurso mudou um pouco, mas a expectativa de que o colaborador deixe seus problemas pessoais de lado ainda está presente.”
Bia Nóbrega:
“Exato! E como é que a gente lida com isso, quando existe essa expectativa implícita de que você precisa ‘dar conta’ do trabalho, independentemente do que está acontecendo na sua vida pessoal? Esse é o desafio.”
Beto Gioia:
“Sim, tudo depende da cultura organizacional. Se estamos falando de um ambiente tóxico, onde o foco está no comando e controle, é difícil criar espaço para que as pessoas possam lidar com suas questões pessoais. Nesse tipo de ambiente, se você menciona que seu filho passou a noite com febre, as pessoas te olham como se você estivesse inventando desculpas. Eu já vi situações absurdas em que um colaborador foi mal visto só porque precisou resolver um problema pessoal fora do horário de trabalho.”
Bia Nóbrega:
“Deixa eu te contar uma história! Teve uma vez que meu marido estava viajando, eu estava presa fora de casa porque perdi a chave e precisava esperar o chaveiro. Isso era tarde da noite, e mesmo assim, minha gestora não permitiu que eu saísse do trabalho. Era um ambiente com uma pressão tão forte que parecia que, se você saísse um minuto antes, era porque não estava comprometido.”
Beto Gioia:
“Exatamente! E esse tipo de pressão subliminar cria um ambiente competitivo, onde as pessoas são julgadas o tempo todo. E isso não é saudável. O ideal seria construir um ambiente de segurança psicológica, onde os colaboradores pudessem ser eles mesmos, com suas falhas e dificuldades, sem medo de julgamento. Hoje é você quem está com um problema, amanhã pode ser eu, e assim por diante.”
Bia Nóbrega:
“E isso só é possível quando temos uma equipe colaborativa, onde o time entende que, se alguém precisa de ajuda em um dia difícil, os outros cobrem essa pessoa. Afinal, somos parte de um todo, e o time precisa funcionar como um suporte mútuo. E, para isso, precisamos de uma liderança segura, que entenda essa dinâmica e promova esse tipo de ambiente.”
Beto Gioia:
“Sim, a liderança tem um papel fundamental. Sem líderes capacitados para exercer empatia, comunicação assertiva e criar um ambiente de apoio, é difícil para as equipes colaborarem de maneira eficaz. E isso não é apenas uma questão de clima organizacional, é uma questão de estratégia de negócios. Se uma equipe é tão dependente de um único colaborador que, quando ele tem um dia ruim, a performance cai, isso é um problema. E, no longo prazo, isso leva a dias de baixa performance de forma recorrente.”
Bia Nóbrega:
“Isso é fundamental. A gente fala muito de ambientes psicologicamente seguros porque os estudos mostram que esses ambientes promovem produtividade e resultados sustentáveis. Não é só sobre ter um pico de performance aqui e ali, mas sim manter uma performance consistente e acima do esperado, porque as pessoas podem ser elas mesmas sem precisar fingir ou esconder quem são.”
Beto Gioia:
“Exato, e é importante lembrar que, quando falamos de ambientes saudáveis, estamos falando de resultados de negócios, não apenas de bem-estar. Melhorar o engajamento, o clima, a liderança e a experiência dos colaboradores não é só sobre tornar o ambiente mais agradável, é sobre construir uma cultura que sustente o sucesso a longo prazo.”
Bia Nóbrega:
“E isso nos leva a um ponto importante: flexibilidade. Quando temos um ambiente onde a flexibilidade é um valor, entendemos que, em alguns dias, um colaborador vai precisar se ausentar ou resolver questões pessoais. E isso é parte do processo. Mas também há casos em que a pessoa quer continuar trabalhando, mesmo passando por problemas pessoais. Como a gente lida com isso?”
Beto Gioia:
“Sim, há casos em que trabalhar é uma forma de reequilibrar a vida da pessoa. E para algumas pessoas, isso funciona bem. O importante é ter um ambiente onde elas possam ser honestas sobre o que estão sentindo, sem julgamento. Se alguém diz: ‘Hoje eu quero trabalhar para esquecer os problemas’, isso precisa ser respeitado. A chave está em construir uma cultura de confiança, onde cada pessoa é vista como única e onde o líder entende as necessidades individuais de cada um.”
Bia Nóbrega:
“Perfeito! O papel do líder é fundamental nesse sentido, conhecendo sua equipe e sabendo como cada pessoa lida melhor com situações difíceis. Mas, para isso, o líder precisa estar capacitado e a cultura da empresa precisa ser acolhedora, permitindo que cada colaborador seja autêntico.”
Beto Gioia:
“Sem dúvida. E muitos líderes ainda não têm esse nível de desenvolvimento, mas isso não é culpa deles. É uma realidade que precisa ser encarada. O desenvolvimento da liderança é uma necessidade contínua, especialmente no contexto pós-pandêmico, onde a flexibilidade e o apoio emocional são mais importantes do que nunca.”
Bia Nóbrega:
“E mais do que isso, precisamos de programas que cuidem da saúde mental dos colaboradores e líderes. Programas de assistência psicológica são fundamentais para construir ambientes mentalmente saudáveis. E isso não é só para o colaborador individual, mas para toda a organização.”
Beto Gioia:
“Exatamente! A cultura de uma empresa define como as coisas são feitas. Se temos uma cultura que valoriza o bem-estar integral — físico, mental e social — isso promove resultados sustentáveis no curto, médio e longo prazo. É sobre criar um ambiente humano e respeitoso, onde dias ruins são aceitos, assim como os dias bons.”
Bia Nóbrega:
“Isso me faz pensar que os valores corporativos são uma ferramenta subutilizada. Muitas vezes, os valores estão ali, mas as pessoas não os utilizam como base para se proteger em ambientes tóxicos. Usar os valores da empresa como respaldo para dizer ‘não’ ou para discordar pode ser uma forma poderosa de criar diálogos mais saudáveis.”
Beto Gioia:
“Sim, é importante lembrar que os valores corporativos não são só palavras bonitas no papel. Eles podem e devem ser usados para guiar comportamentos e decisões. E quando um colaborador se apoia nos valores para tomar uma decisão, ele está contribuindo para fortalecer a cultura da empresa.”
Bia Nóbrega:
“E para fechar, Beto, como você lida com um dia ruim no trabalho? Qual seria sua dica final para equilibrar a vida pessoal e profissional nesses dias difíceis?”
Beto Gioia:
“Minha dica é simples: resgate o seu propósito. Quando estamos passando por um dia difícil, lembrar por que estamos fazendo o que fazemos pode nos ajudar a focar e continuar. Isso não significa ignorar seus problemas, mas encontrar um equilíbrio entre enfrentar suas dificuldades e manter seu foco no trabalho. E, acima de tudo, ter um ambiente de apoio ao seu redor faz toda a diferença.”
Bia Nóbrega:
“Com certeza, Beto! Esse desabafo foi essencial para refletirmos sobre como equilibrar nossas vidas pessoais e profissionais, especialmente nos dias difíceis. Obrigada por mais esse desabafo!”